Escrito por: ISP

ISP denuncia: reforma administrativa de Bolsonaro ameaça direitos sociais de quem mais precisa do Estado

Internacional de Serviços Públicos (ISP) divulga nota contra reforma do desgoverno-federal

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A Internacional de Serviços Públicos, sindicato global organizado em 154 países, representando 30 milhões de trabalhadores e trabalhadoras do setor público e do setor privado de natureza pública, vem manifestar-se contrariamente à proposta de reforma administrativa apresentada pelo governo brasileiro.

No momento em que o Brasil alcança a vergonhosa e dramática marca de 4 milhões de pessoas contaminadas pela covid-19, o presidente Jair Bolsonaro apresenta a PEC da Reforma Administrativa ao Congresso Nacional. Algo totalmente contraditório com a demanda do país, uma vez que a pandemia trouxe à tona a importância da valorização, ampliação e melhoria do atendimento nos serviços públicos para salvar vidas e garantir o funcionamento dos serviços essenciais.

A proposta encaminhada ao Congresso Nacional destrói direitos e rompe com a proteção necessária para que servidores e empregados públicos tenham condições estáveis e dignas para desenvolver suas funções sem aparelhamento do Estado, de forma republicana e independente do governo que estiver no comando da gestão.

A PEC pretende acabar com a promoção por tempo de serviço, elimina a estabilidade no emprego restringindoa às carreiras típicas de Estado e o acesso por meio de concurso público, altera o caráter do estágio probatório e transforma-o em período seletivo, acaba com o Regime Jurídico Único e submete o corpo funcional do Estado à situação orçamentária de seus altos e baixos.

Na verdade, essa “Reforma Administrativa” do governo Bolsonaro esconde uma contra reforma de Estado. Isso porque ela tem nas privatizações um pilar importante. A visão ultraliberal do atual governo, organiza o serviço público a partir da redução do Estado. Enquanto vários países do mundo reestatizam ou remunicipalizam serviços tais como saúde, educação, assistência social, água, saneamento e energia - entre outros- o Governo brasileiro quer privatizar.

Fica obvia a intenção do governo de entregar as empresas estatais, bancos, fundações, órgãos e serviços públicos para a iniciativa privada, reservando somente as carreiras típicas de Estado, basicamente poder de polícia, fiscalização e burocracia ao setor genuinamente público.

Apesar de afirmar que a Reforma Administrativa vai atingir apenas os novos servidores - o que já seria ruim -, ela certamente afetará a todos. Ao acabar com o Regime Jurídico Único, a proposta possibilita novas formas de contratação, deteriorando as relações de trabalho. Além disso, a criação dos chamados mecanismos de avaliação de desempenho sem transparência, na verdade abrirão as portas para todo tipo de perseguição e assédio moral. O tão almejado “enxugamento” vai desmontar toda a discussão que aconteceu entre 2004 e 2016 e que possibilitou a criação de alguns parâmetros para as carreiras ligadas aos direitos sociais, como Saúde, Educação e Assistência Social.

Vale ressaltar que a discussão sobre a Reforma Administrativa deve chegar a estados e municípios rapidamente. Em um período de dificuldade orçamentária, dado o momento de crise econômica, prefeitos e governadores poderão equivocadamente abraçar essa proposta, sendo que o correto seria a discussão sobre um novo pacto federativo.

A política de cortes de gastos fruto da volta do velho neoliberalismo em nosso país, após o Golpe de 2015, está destruindo nossa cidadania e a soberania nacional. A reversão deste quadro começa pela anulação da Emenda Constitucional 95 que congelou por 20 anos os investimentos públicos, assim como pela recuperação das verbas perdidas, inclusive já na votação Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020.

Tramita também a proposta de reforma tributária do governo que precisaria, (mas não é) ser justa e inclusiva, taxando os ricos e aliviando a carga tributária sobre os pobres, discussão pertinente para o momento. Diante da urgente necessidade de reduzir as desigualdades sociais e mitigar o impacto da pandemia, o governo deveria centrar esforços para aumentar a tributação sobre o patrimônio, com elevação das alíquotas sobre as grandes propriedades rurais e heranças, além de instituir a taxação sobre grandes fortunas e sobre o capital especulativo rentista e seus dividendos. Ao mesmo tempo, é fundamental reduzir seletivamente a tributação sobre o consumo.

Existem caminhos. Certamente, penalizar servidores e servidoras e a população que precisa dos serviços públicos e da garantia dos diretos sociais não é um deles. A pandemia escancarou a necessidade de um Estado forte, com profissionais valorizados e com segurança para desempenhar suas funções. As carreiras públicas dão racionalidade às administrações e possibilitam a garantia do Estado democrático de direito. Servidores contratados por concurso público são guardiões do patrimônio público e não de interesses privados!

Precisamos, sim, discutir a eficiência e a recuperação do serviço público. Pesquisa nacional sobre condições de trabalho na pandemia no âmbito da campanha mundial “Trabalhadoras e Trabalhadores Protegidos Salvam Vidas” demonstrou alto índice (63%) de insuficiência de Equipamentos de Proteção Individual, 77% não tiveram capacitação técnica adequada e 54% informaram estar em sofrimento psíquico. É preciso investir efetivamente em serviços públicos de boa qualidade e isso se faz com orçamentos robustos, diálogo social e negociação coletiva e não com precarização, maquiada de modernização.

Ainda temos um longo caminho a percorrer e faremos essa caminhada lado a lado com parlamentares progressistas, entidades representativas do funcionalismo, movimentos sociais e a sociedade civil, construindo a Jornada Unitária em Defesa dos Serviços Públicos e dos direitos sociais do povo acima do lucro.

4 de setembro de 2020.